A foto do lado esquerdo mostra os yakko acompanhando o daimyo. A foto do lado direito mostra o happi, vestimenta característica de alguns festivais japoneses.
Não
há nada mais icônico para o karatê que um kimono branco com uma
faixa preta. Habitualmente chamado de karategi (gi,
flexão de ki,
着,
roupa) ou keikogi (keiko,
稽古,
treino), o uso desta vestimenta nem sempre acompanhou o karateka na
sua história, é algo bastante atual, mas que teve uma influência
antiga.
No
livro O
Dojo,
de Dave
Lowry,
há o histórico do desenvolvimento do kimono marcial. Tudo começou
durante o Sengoku
Jidai,
a guerra civil que se iniciou no século XV e que durou séculos no
Japão, fazendo com que o algodão fosse introduzido no Japão
pela Coréia e pela China. Essa importação causou uma revolução
na economia japonesa pela sua facilidade de cultivo e fabrico dos
tecidos.
No
século XIX, Jigoro Kano (1860-1938), o educador e fundador do
judô Kodokan foi
responsável pela difusão e transformação do keikogi.
Acreditava que a sua inspiração veio das vestimentas pesadas
utilizadas pelos bombeiros japoneses, as quais foram inspiradas nas
roupas usadas pelos yakko (criados,
valetes que acompanhavam o daimyo ou
samurai de alta patente. Carregavam bandeiras e mastros decorados
para mostrar o status do clã). As vestimentas dos bombeiros,
chamadas hanten ficavam
pela cintura, mais longas que as dos yakko.
Há
algumas fotografias de Kano e dos seus alunos com este tipo de
vestimenta, conhecidas como uwagi,
que se parecem muito com o hanten utilizado
pelos bombeiros. Tinham a bainha da roupa no nível das nádegas e as
mangas curtas que posteriormente se alongaram até ao antebraço para
evitar magoarem-se no cotovelos, causado pelo tatame, juntamente com
a bainha que ficou mais longa também.
Nessa
época, o karatê em Okinawa era praticado apenas com tangas devida á
humidade e calor típica da ilha. Os japoneses consideravam os
praticantes de karatê uns desordeiros . Então, para esta arte
marcial ser bem recebida pelo resto do país, era necessário uma
roupagem adequada. Gichin Funakoshi, fundador da Shotokan,
aparece vestindo judogi com
os seus alunos numa foto de 1930. Quando o karatê passou a
desenvolver-se mais e a criar a sua própria identidade,
o keikogi também
se adaptou as necessidades das técnicas, tornando-se mais leve
utilizando o algodão.
A
cor tradicional é branco por ser a cor natural do algodão, por ser
económico e refletir espírito de simplicidade e naturalidade, o
qual combina com os ensinamentos do budo.
Mestre Jigoro Kano |
As
calças foram adicionas posteriormente, após a Segunda Guerra
Mundial. Em japonês, calça é zubon e
só foi adicionada ao vocabulário após o período feudal, no Japão
pré-moderno, pois os homens não vestiam nada abaixo da cintura -
apenas um tapa-sexo ou o hakama.
Novamente é Jigoro Kano que faz com que calça se torne parte
do keikogi,
já que os judocas assim como os praticantes de outras artes marciais
usavam o hakama ou
nada nos treinos. No início, era o gobatake,
um shorts largo que
ia até a coxa, mas provavelmente Jigoro Kano achou que calças mais
compridas protegeriam os judocas de lesões.
“Eles
têm um único cordão, que é passado pela frente da cintura através
de um passador no cós, que dá a volta sobre si mesmo nas costas e
passa novamente pela frente. E é fechado ao se puxar as pontas do
cordão, que têm nós para evitar que voltem para dentro do
cós” (Dave
Lowry)
Motobu Choki, mestre de karatê e suas calças de kimono curtas |
O keikogi não
é uma das roupas mais confortáveis e para um iniciante nas artes
marciais parece que atrapalha e deixa os movimentos mais presos.
Porém, com o tempo o corpo adapta-se aos movimentos do keikogi e
o karateca começa a perceber que praticar arte marcial sem ele
definitivamente não é a mesma coisa. Os movimentos ficam mais
bonitos, mais fortes e até a sua figura fica mais austera. Arte
marcial é superação até quando se trata do próprio uniforme. O
karateca aguenta o peso do tecido e a temperatura, para que,
independente da roupa que tenha vestido, possa dar o seu
melhor.
Sem comentários:
Enviar um comentário