terça-feira, 13 de junho de 2017

O MEDO


Ao contrário do que a generalidade das pessoas pensa, o ser humano, perante a ameaça à sua integridade física, tem frequentemente uma resposta: o medo;
sendo esta reação favorável se for aproveitada.

Este sistema de sobrevivência, deve ser reconhecido e utilizado em proveito próprio, evitando que nos bloqueie, caso muito frequente nas pessoas pouco expostas a situações de agressão, existindo uma grande percentagem de pessoas em que o medo "paralisa" ao invés de cumprir a sua finalidade: salvar-nos.

O que ocorre quando temos medo? O medo não é só um sentimento, é também, um complexo jogo de combinações entre diferentes componentes de reação:





- Componente cognitivo – Componente fisiológico – Componente motor

São estes os três componentes que constituem a reacção de "medo", sendo este um sistema biológico de sobrevivência no ser humano.

Ao reconhecer o perigo, o sistema é ativado de imediato: a tensão arterial sobe, aumenta a frequência cardíaca e respiratória, intensifica-se a sudação e os cabelos ficam levantados.

Tudo acontece num brevíssimo espaço de tempo, frequentemente apenas em frações de segundo, entre o começo dos sinais de alerta e a reação, permitindo reunir as forças corporais. Todas as reservas são mobilizadas para a iminente "luta" ou "fuga".

Está em jogo a "sobrevivência" ficando física e psiquicamente preparado para ela.

Experimentamos o medo como um estado anímico, atua como um sistema de alarme, que avisa do perigo, e deste modo, protege-nos.

O medo ativa a capacidade do homem, elevando ao máximo a vigilância.


  • Os nervos periféricos comunicam os estímulos de perigo, provenientes dos órgãos dos sentidos, ao córtex cerebral.
  • No córtex cerebral tem lugar um processo de tomada de consciência a que associamos "perigo".
  • Com a captação dos sinais de perigo, produzem-se emoções de medo no hipotálamo, localizado no interior do cérebro, junto da glândula hipófise.
  • As emoções de medo são transmitidas à hipófise.
  • A hipófise liberta, então, a hormona ACTH (hormona adrenocorticotropica) na corrente sanguínea.
  • A glândula supra-renal, estimulada pela ACTH, que circula no sangue, reage automaticamente, libertando hormonas, em especial a adrenalina, que aumenta a frequência cardíaca.
  • Estas hormonas preparam o organismo para a luta e para a fuga.
  • Simultaneamente, as emoções de medo produzidas no hipotálamo ativam o sistema neuro-vegetativo.
  • A formação reticular, localizada na base do cérebro, recebe informação do estado de alerta e envia impulsos nervosos ao córtex cerebral.
  • Estes impulsos, provenientes da formação reticular, "acendem" ao córtex cerebral, o qual permanece em estado de extrema prevenção, com melhoria da atenção, todos os estímulos do meio ambiente são sentidos com especial agudeza e elaborados com máximo cuidado. Só nos resta esperar o momento oportuno para atuar.

Mais tarde ou mais cedo, qualquer praticante de artes marciais vê-se confrontado com um problema crucial: o medo. Mesmo os combates amigáveis, que decorrem durante os treinos, não deixam de comportar os seus riscos. Quem já experimentou um ou dois golpes não consegue evitar um certo receio, por vezes até um pavor, cujo efeito é paralisante.

Em caso de perigo real, as consequências podem tornar-se dramáticas, um ser humano, subjugado pelo medo é incapaz de alcançar a verdadeira mestria. Assim, libertarmo-nos do medo constitui uma etapa decisiva.

O samurai, que tinha por destino arriscar a vida, todos os dias, via-se obrigado a encontrar rapidamente uma solução para este problema. Se no campo de batalha se sentisse aterrorizado face ao inimigo, era-lhe impossível enfrentá-lo com eficácia.

Por esta razão, o general Kenshin (faleceu em 1578), um adepto do zen, costumava dizer aos seus homens: “Ide combater firmemente convencidos da vitória e regressareis a casa sãos e salvos. Empenhai-vos no combate decididos a morrer e dele saíreis vivos, porque aqueles que se agarram à vida, morrem, e aqueles que desafiam a morte, vivem.”

Uma máxima do jiu jutsu exprime a mesma ideia noutros termos: “A queda é inevitável para aquele que se agarra, mas aquele que não se agarra nada tem a temer.”

Fácil de dizer...mas muito difícil de realizar. Contudo, parece que o homem é capaz de coisas prodigiosas, nos casos mais desesperados, quando a sua vida se encontra em perigo: chama-se a isso “instinto de sobrevivência”.



Na vida corrente, raramente o homem comum tira proveito das suas potencialidades, mas, quando se lhe depara um perigo repentino, consegue reagir com uma força e uma velocidade impensáveis.

Numa situação de vida ou de morte, tudo acontece muito depressa: não há lugar para o supérfluo. Cada fração de segundo conta; trata-se de estar presente, aqui e agora. As interferências psicológicas ou emocionais desaparecem para dar lugar a uma energia superior. Assim que se afasta o perigo e que esse estado de alerta deixa de ser necessário, manifesta-se de novo, a personalidade comum e o medo pode repetir-se, a maior parte das vezes por pequenos motivos.

Os mestres, afirmam que existe uma possibilidade de nos libertarmos do medo, mas, para o conseguirmos, é indispensável reconhecê-lo e conhecer a sua origem. Se a encontrarmos, o medo desvanece-se como uma nuvem de fumo.

Um exemplo clássico, é a história de um mestre da cerimónia japonesa do chá, vivia na província de Tasa; não era um versado de grande capacidade espiritual, mas possuía aptidões para a meditação.




Um dia, numa ponte, ofendeu sem querer, o orgulho de um samurai, este desafiou-o para um duelo. Conhecendo a destreza de um samurai com a catana, o mestre de chá intuiu que a sua morte estava perto. Mas seria uma morte digna! Não estava disposto a perder a sua integridade pelo simples medo da morte.

Com elegância, começou a respirar, tal como fazia quando manejava os utensílios da cerimónia do chá (Cha Do, ou também Cha No Yu).

Esta serenidade e confiança, dada pelo raciocínio, junto com a falta de medo á morte, assustou o samurai, que suplicou perdão e abandonou o duelo.


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